Astrofotografia com celular é possível? Fotografar estrelas com celular é uma realidade? Se sim, como fazer?
Essa é uma pergunta muito frequente. A vontade de registrar a beleza do céu noturno é quase irresistível. Mas por muito tempo isso ficou limitado aos que tinham boas câmeras e, claro, aos que sabiam usa-las. Quem nunca se frustou tentando fotografar estrelas com celular e tudo o que conseguiu foi uma foto completamente escura, desfocada e tremida?
A boa notícia é que isso está chegando ao fim! O novo celular da Google, o Pixel 4, trouxe melhorias muito consideráveis para a fotografia noturna e agora podemos dizer que é possível fotografar estrelas com celular sim! Ainda não é a coisa mais acessível do mundo, já que o celular é caro e não é vendido no Brasil. E mesmo que fosse, fotografar estrelas com ele não é apenas apontar para o céu e apertar o botão. Imagino que isso vai continuar frustrando alguns usuários.
Para entender o que o Pixel 4 trouxe de novidades, de forma que possibilitou fotografar estrelas com celular, continue lendo o texto. Mas, se você quiser ir rapidamente para as dicas de como otimizar as sua astrofotografia com celular, clique aqui para ir direto à isso. 😉
Antes de começar a falar do Pixel 4, quero deixar claro que eu mesmo não testei esse celular pessoalmente. Tudo o que vou dizer aqui é baseado em reviews de outros fotógrafos que eu confio e também nas informações divulgadas pelos próprios desenvolvedores deste smartphone. Dito isto, vamos ver as novas tecnologias que esse celular tem e que o tornaram capaz de fazer fotografias de estrelas:
Tempo de Exposição
Quando fotografamos estrelas, estamos em um ambiente muito escuro. Quanto mais escuro melhor. Nos primeiros minutos o nosso olho mal consegue enxergar coisa alguma. Depois de um tempo começamos a ver mais detalhes, e as estrelas começam a saltar aos nossos olhos. Mesmo assim, ainda tem bastante coisa que não vemos. E, nesse ponto, o nosso olho é bastante superior ao sensor da nossa câmera. Então, se a gente vê pouca coisa, a nossa câmera vê menos ainda.
Para que elas consigam receber luz suficiente para criar uma foto, precisamos fazer uma longa exposição. Isso quer dizer que precisamos tirar uma foto que vai ter uma longa duração. O Pixel 4, no modo de astrofotografia, faz fotos de 4 minutos de duração. Durante esses quatro minutos, a luz disponível no ambiente atinge e se acumula no sensor da câmera, de maneira a ter uma intensidade suficientemente grande para gerar uma imagem. A partir disso, já temos algumas coisas a serem consideradas:
A primeira delas é que o celular precisa ficar imóvel. Tudo que se move durante o período em que a foto está sendo feito, vai ficar borrado. Assim, para ter uma foto nítida, você vai precisar deixar o celular bem paradinho, apoiando-o em alguma coisa ou mesmo usando um tripé.
A segunda coisa é considerar o movimento das estrelas. E nisso, o Google precisou desenvolver um software bem inteligente. As estrelas, assim como a lua e o Sol, se movem no céu de leste para oeste. O período de 4 minutos de exposição é o suficiente para que as estrelas se movam e criem pequenos riscos na foto, marcando o caminho que elas percorreram no céu. Chamamos isso de Startrails. Às vezes, nós queremos justamente fotografar esses rastros, mas eles precisam ficar longos o suficiente para que fique uma foto legal. Pequenos Startrails dão uma impressão estranha, de que a foto saiu errada, ou mesmo de que as estrelas não estão bem focadas. Você pode ler esse meu artigo aqui para entender melhor isso.
No Pixel 4, o tempo máximo de exposição, para que as estrelas não formem riscos perceptíveis na foto é de apenas 16 segundos. E agora vem um dos truques do algorítimo por trás da câmera. O que o Pixel 4 faz durante esses 4 minutos, é na verdade, 15 fotos diferentes de 16 segundos cada. Depois, ele é inteligente o suficiente para pegar essas 15 fotos e alinhar todas elas. Dessa maneira, ele corrige a posição das estrelas em cada foto, sobrepondo-as umas às outras. Ao fazer isso, ele intensifica a luminosidade da cena ao mesmo tempo que tem estrelas pontuais, ao invés de rastros. Engenhoso não?
O terceiro ponto é a paciência. Mas como assim? Achei muito interessante que os desenvolvedores do Google pesquisaram quanto tempo os usuários estariam dispostos a esperar por uma foto de estrelas. E o resultado dessa pesquisa foi os 4 minutos de exposição. Isso é muito importante porque, se os usuários topassem esperar por mais tempo, o celular poderia tirar mais fotos, e ter mais luz, para enfim criar uma imagem cada vez melhor. Mas eles estabeleceram esse limite de maneira muito atenciosa com os consumidores, sabendo que eles não teriam paciência para esperar muito tempo por uma foto e isso os deixaria frustrados.
A quarta consequência de um tempo de exposição longo, em um ambiente muito escuro, é o surgimento de ruído e pixels mortos. Basicamente o sensor recebe um sinal elétrico mais forte (ISO alto) e por mais tempo do que uma foto usual, causando aquecimento do sensor da câmera e interferências no resultado final da imagem, que são experimentados como ruído e pixels mortos. O software inclui portanto um algorítimo capaz de identificar essas interferências e limpa-las da melhor maneira possível.
Composição
Esse é mais um ponto que o Pixel 4 teve atenção com a experiência dos usuários. Antes de fotografar uma cena, você antes precisa apontar o seu celular para ela e fazer o enquadramento que deseja, certo? O problema é que nesse caso, o ambiente está muito escuro, e a câmera enxerga menos que você, lembra? Assim, quando você olha no visor do celular, você vê menos do que vê a olho nu, e não sabe exatamente o que a câmera está enquadrando, dificultando muito você fazer a composição da sua foto. É o mesmo problema que as câmeras mirrorless tem ao serem usadas para astrofotografia.
Pensando nisso, os desenvolvedores da Google pensaram que o usuário poderia ver a foto sendo formada ao mesmo tempo em que ela está sendo feita, durante aqueles 4 minutos de exposição. Assim, a partir dos primeiros 16 segundos (a primeira foto) você já tem um feedback na sua tela, da foto que está sendo feita. E, como um filminho, você pode ver ela aparecendo aos poucos. Dessa maneira, se você não gostou do enquadramento ou de outra coisa qualquer, você pode decidir cancelar a foto antes de precisar esperar os 4 minutos inteiros.
Autofoco
Como a câmera mal enxerga no escuro, ela não tem informação suficiente para fazer um foco automático. Ela simplesmente não vê nada, a princípio. À partir do momento em que a longa exposição começa, o algorítimo pode começar a colher informações e decidir se a foto está focada ou não. Porém, o foco precisa ser feito antes da exposição começar certo? Para resolver essa questão, entre as 15 fotos que o Pixel 4 faz, ele varia o foco entre elas. Hora focando mais pertinho, hora focando mais longe. Depois de testar algumas possibilidades, ele analisa todas e decidi qual é o foco certo, e então apresenta esse resultado para você. Se mesmo assim o Pixel 4 não tiver certeza de qual é o melhor ponto para focar, ele vai te mostrar as opções que ele gerou, para que você decida qual é a mais correta.
Tratamento da Imagem
Além de tudo, este celular tem um photoshop dentro dele mesmo que faz um tratamento automático na foto. Para isso ele usa uma programação do tipo rede neural. Como isso funciona? É como se os programadores tivessem mostrado para o celular cerca de 100.000 imagens de paisagens com céu noturno, e disseram pra ele o que é céu e o que é Terra na foto. A partir dessa biblioteca, o algorítimo do celular é capaz de ver a sua foto, e distinguir nela o que é céu e o que é horizonte, árvore, montanha e etc. Dessa maneira ele pode fazer um tratamento na imagem, por exemplo azulando só o céu, intensificando o brilho só das estrelas, recuperando alguns detalhes da paisagem como nas árvores, pedras e etc. Isso é inteligência artificial.
Como fotografar melhor as estrelas usando o celular
Percebe-se o quanto de tecnologia tem por trás do Pixel 4 e o quanto isso deixa a astrofotografia com celular mais acessível, não é? Mas mesmo assim, o celular, e as câmeras de maneira geral, entregam resultados melhores se estivermos atentos à algumas técnicas básicas das Astrofotografia, que sempre irão ajudar a capturar esse tipo de imagem, não importa com qual equipamento. As imagens apresentadas aqui foram todas feitas com o Pixel 4 e seguindo as condições abaixo, afim de otimizar os seus resultados com a Astrofotografia:
- Mantenha seu celular o mais imóvel possível. Tente usar um tripé bem firme, não encoste nele enquanto a foto estiver sendo feita. Tente protege-lo ao máximo de ventos e outros fatores que ele façam ele tremer
- Fotografe longe de centros urbanos, onde a poluição do ar e a poluição luminosa são intensas. Procure locais com céu limpo e sem luzes artificiais nas proximidades. Quanto mais escuro melhor. Consulte o Light Pollution Map para isso
- Idealmente fotografe em noites de lua nova. A luz da Lua interfere na visibilidade das estrelas. Se não der, procure a lua mais fraca possível, e também enquanto ela estiver abaixo da linha do horizonte.
- Tente incluir o centro da via láctea nas suas fotos, ele é o ponto mais luminoso do céu noturno.
- Inclua na sua composição elementos da paisagem, como árvores, barracas e outros elementos que dê contexto à sua foto.
- Ao adicionar pessoas lembre-se de que elas precisam ficar o mais imóveis que conseguirem enquanto a foto estiver sendo feita.
Comenta aqui o que achou desse artigo, se já tentou fotografar estrelas com o celular e também compartilha as suas fotos comigo!
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Abraços e boas fotos!